terça-feira, 11 de setembro de 2012

Apoliticamente, a FIFA protege a ditadura e expulsa a democracia nos campos do Chile




"Não vou renunciar. Colocado no caminho da História pagarei com minha vida a lealdade do povo. E digo que tenho certeza de que a semente que deixamos na consciência digna de milhares e milhares de chilenos não poderá ser ceifada definitivamente. Eles têm a força, poderão submeter-nos, porém não deterão os processos sociais nem com crimes nem com a força. A história é nossa e é feita pelo povo".
últimas palavras de Salvador Allende transmitidas por rádio durante o cerco ao La Moneda.



O uso e abuso da história - Pelas coincidências que só a história oferece através do calendário, o Chile enfrenta a Colômbia pelas eliminatórias, no emblemático 11 de Setembro. Nesse dia em 1973, o presidente, eleito democraticamente, Salvador Allende, sofreu um golpe que instaurou uma ditadura sanguinária. O jogo de hoje seria no Estádio Nacional de Santiago, palco de torturas e execuções durante a ditadura Pinochet. A torcida, nome dado ao povo no estádio, do Chile preparava manifestações, a maioria saudosas homenagens a Salvador, o valente. 


O que faz a FIFA? Proíbe o jogo de ser realizado no Estádio Nacional alegando manter o caráter “apolítico” da entidade. Atitude condizente com o caráter hipócrita da organização que monopoliza o jogo.
O Chile joga contra ninguém e faz o gol mais triste de todos
Pouco tempo depois do golpe, no mesmo ano, o Chile enfrenta a União Soviética pela repescagem da Copa do Mundo de 1974. O local escolhido para o jogo da volta foi o Estádio Nacional, aquele mesmo dos massacres e masmorra da dignidade humana. Os jogadores da URSS se recusam a entrar no campo com uma declaração que entraria para a história: “Não jogaríamos em Auschwitz, não vamos jogar aqui.” De nada adianta o protesto soviético, a seleção chilena entra em campo sozinha e marca o gol mais triste do futebol, contra ninguém pois seu adversários se solidariza com a o sofrimento do seu povo. A FIFA confirma a vitória do Chile, classificado para a Copa, e pune a URSS, com a exclusão de competições internacionais. A entidade a época era dirigida por Stanley Rous, notório defensor do Apartheid. Em 1961, a África do Sul brutalmente segregacionista é expulsa da Confederação Africana, Stanley não hesita em defender o que acredita: suspende todos os países africanos da entidade em resposta ao boicote contra o racismo, exceto, claro, a África do Sul branca.  
Ao invés de jogadores, soldados e mortes

Assim a FIFA se fez, e se faz, apolítica: impedindo manifestações democráticas e tudo que pode parecer popular. “Apoliticamente”, a cínica FIFA serve como instrumento para ditaduras que bebem sangue do próprio povo e regimes violentamente racistas. A classificação da seleção chilena para a Copa de 74, baseada no fantástico time do Colo-Colo de 73, evidentemente foi utilizada por Pinochet. Da mesma maneira, a manutenção da África do Sul racista nos quadros da FIFA, em detrimento, de todo o continente legitimou o regime do Apartheid.


Não se trata da atitude isolada de um presidente em uma época especifica, a FIFA sempre soube entender onde estava o poder e com quem estava o dinheiro. Sempre contou com a cumplicidade da mídia, que exemplarmente demonizava a URSS e citava a África do Sul e Chile como sucessos de ordem. A mídia ecoa a linguagem FIFA: os interesses da FIFA são sempre chamados de “exigências” pelos jornais, a escandalosa corrupção são ditas “transações” e o autoritarismo é batizado “questões de seguranças”, como a vergonhosa proibição do jogo em um templo do esporte mausoléu do povo chileno. Valente, a hincha do Chile não cederá, homenageará seus heróis e reverenciará seus mortos, apesar das covardias com o selo FIFA. Cabe ao Brasil se solidarizar com o passado e presente dos amigos ao sul, mas com um olho aberto para o futuro: a Copa de 2014 está aí. A história também, ninguém se esqueceu de quando se jogou e não se jogou no Estádio Nacional.



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